domingo, 29 de maio de 2011

Fruição platéia versus artista (Á apresentação de Hoje 28.05.2011 "Me refaz")

O amigo Bailarino e professor de Ballet, disse-me algo importante que disse seu professor de Ballet. Disse-lhe (e disse-me) que "deve-se dançar para si, não para quem está assistindo-platéia, pois este não sabe o que você, bailarino/dançarino passou (de vivências) para chegar até aquela cena e que por mais que o espectador se esforce, se não souber o que é esse nosso fazer (tendo vivido) jamais justificará  e jubilará aquilo que vê acontecer". Algo mais ou menos assim!
Penso mais: preparar o corpo para a cena, para se apresentar é, todavia, escolha íntima, escolha sua (do artista) empiricamente, então há de se arcar com suas demandas, suas necessidades, suas amarguras...
Colocar o espectador num lugar de albatroz não justifica sua presença no palco, então dance no banheiro (e isso não é uma grosseria, é até mais sincero), ou  ainda: continue dançando no banheiro e as gotas do chuveiro, quente morno ou frio, lhe aplaudirá com a intensidade que estiver: quente morno ou frio!
Eis o ofício do bailarino/dançarino, performer, ator, atriz, etc = ARTISTA: Ser "recompensado" (aspas porque não é bem isso) ou não com a presença do outro; com a apreciação-fruição do outro (ou não) é algo altruísta-holístico...
Penso nos artistas plásticos que enciumados de sua arte, a queima sem que o outro a veja. Uma escolha, narcisística (e pode nem ser narcisismo, mas uma patologia, etc.) ou não, encerra a relação que estou tratando, artista  versus platéia.
E se o dentista pensar assim? Não cuidará de nossas angústias bucais? Ficará trancafiado em seu consultório, narcisando-se? E se o médico-cardiologista pensar assim? Não acompanhará nossas infermidades do coração?
Quem alegra o Mundo, a propósito?
Ouvi dizer que é o  artista! Então, "sair à luz", com expressa Damásio, nada mais é do que poder entreter o olhar do outro de tanta carência ao seu redor. É suspendê-lo da realidade e propiciá-lo outro lugar étereo-perene/efêmero: e ao que vai à cena: o mesmo lugar: o abandono de si, de sua psique, para viver outra coisa que está em si, mas que não o é, (que está além de si) e esse sentimento é exclusivamente de quem o faz. A platéia jamais o saberá, tão pouco justificar e o aplauso pode ser o encontro das realidades em espaço-tempo real, cheios de tantas interpretações, fruições e sentido (e nisso se aloja o mistério inacabado deste mundo).
Então, enquanto se aplaude tudo vai voltando aos seus lugares primeiros, como no início da apresentação, a ansiedade do que virá-e-verá na cena.
E a vida se revela perfeita, livre, viva, gerando e revelando alternativas de permanecer. Enquanto se aplaude todo o mistério dos êxtases vão se retirando e retornam aos lugares onde se escondem, enquanto artista e platéia não se veem...